Com vestígios de ocupação romana, islâmica e cristã, o hisn de Coina implanta-se num monte escarpado, paralelo ao Cabeço dos Caracois, contornado pelas ribeiras do Alambre e de Coina, de difícil acesso a Norte, Leste e Oeste. Reveste-se de uma natural importância estratégica, não só pela facilidade de articulação em acções de defesa entre os Castelos de Palmela e Sesimbra, mas também na defesa contra forças que através do Portinho da Arrábida quisessem penetrar na península da Arrábida. Uma implantação geo-estratégica que pode ter justificado um ribat destruído aquando dos recontros entre muçulmanos e cristãos em 1191, nunca mais reconstruído, embora seja mencionado no testamento de D. Sancho I (Rasteiro, 1897).
in FERNANDES, Isabel Cristina Ferreira (2004) – O Castelo de Palmela do domínio islâmico ao cristão
Importa aqui referir que no decorrer da nossa investigação in loco verificámos, em todas a cintura do cabeço de Coina-a-Velha, uma diversificada e sugestiva concentração de residuais topónimos históricos: o caminho que nos leva até ao arqueossítio do Casal do Bispo tem no seu início uma placa de mármore com a inscrição “Estrada dos Romanos”; no sopé da vertente Nordeste do cabeço encontramos a “Quinta do Lapidário”; na vertente Sul, na Aldeia dos Topos, acrescentam-se as quintas da “Ermida”, “Abades” e “Santa Madalena”.
Numa visita que intentamos ao local (2) confirmámos as nossas suspeitas aferidas a partir da imagem de Google Earth: actualmente o arqueossítio encontra-se em parte coberto por uma densa vegetação, praticamente destruído sob o edificado habitacional em expansão e remodelação desde o século XVI. Falamos de uma grande casa “acastelada”, com mirantes e alpendres, bem visível da estrada Aldeia-de-Irmãos/Portinho da Arrábida, no alto do cabeço contornado pela Ribeira do Alambre.
Ainda acerca do sítio de Coina-a-Velha, Joaquim Rasteiro relata uma curiosa e reincidente lenda que conta que os mouros deixaram três casas subterrâneas: uma cheia de armas, já aberta (a cisterna), outra cheia de ouro e outra com peste, pelo que ninguém se atreveu a procurar o ouro com receio de encontrar a peste (Rasteiro, 1897).
Segundo Jorge Alarcão, a via romana que ligava Olisipo a Emerita Augusta passava primeiro por Equabona e Caetobriga – «a via partia provavelmente do Seixal»; «Equabona, distante 12 milhas de Olisipo, corresponde possivelmente a Coina-a-Velha», uma das aldeias da freguesia de S. Lourenço. Joaquim Rasteiro, por seu turno, transcreve uma nota de José Leite de Vasconcellos onde se lê: «A palavra Coina representa ainda, quanto a mim, a antiga Equabona, designação de uma conhecida cidade da Lusitânia. A série das formas por que a palavra primitiva passou até hoje poderá ter sido a seguinte: Equábona>(E)quab(o)na>Cauna>Couna>Colna. A pronúncia popular actual supponho que é Côina, e não Cóina, que é litteraria».
(1) «A cor vermelha resulta da aplicação de um tratamento contra a eutropização das águas, à base de óxido de ferro, resina e argilas vermelhas.» (Fernandes, 2004).
(2) Em meados de Maio de 2009 tentámos visitar o Castelo de Coina-a-Velha, visto o arqueossítio se encontrar no interior de uma propriedade privada procuramos o proprietário que rudemente nos expulsou sem qualquer abertura ao diálogo. Ainda assim conseguimos identificar os restos de uma estrutura murada associada a cerâmicas de construção de aspecto grosseiro e antigo.
Outros arqueossítios islâmicos da Arrábida (ou não!)
Cruzando a leitura das paisagens, os indicadores toponímicos, a informação histórica e os dados da Arqueologia, é possível confirmar uma intensa ocupação rural islâmica predominante a Sul da península da Arrábida, “intramuros” da cintura defensiva delineada pelos husūn (circunscrições defensivas, administrativas e fiscais) de Palmela, Coina, Sesimbra e Almada. Além destes castelos, o sistema defensivo era reforçado pelo entrecruzamento de ângulos territoriais de defesa e comunicação estabelecidos com a guarnição de ribats e atalaias.
Importa referir que no elenco dos sítios que sugerimos ressaltam alguns que não constituem verdadeiros arqueossítios, mas que pela sua implantação e indicadores toponímicos reúnem fortes probabilidades de ocupação islâmica, damos como exemplo o Convento da Arrábida; e outros, que não tendo seguros vestígios de ocupação islâmica entendemos merecerem a sua inclusão e desmistificação (exemplo do “Castelo dos Mouros”).
- Castelo (hisn) de Palmela
- Palmela – centro histórico
- Alcaria do Alto da Queimada – Serra do Louro
- Cumeada da Serra de São Luís
- Setúbal – área urbana
- Mouguelas
- Outão
- Praia dos Coelhos/Galapos
- Creiro
- Convento da Arrábida
- “Castelo dos Mouros”
- Castelo (hisn) de Coina-a-Velha
- Castelo (hisn) de Sesimbra
- Vale da Vitória – Terras do Risco
- Lapa do Fumo – Serra dos Pinheirinhos
- Azóia
- Ermida da Memória – Cabo Espichel
Por Miguel Amigo & Ricardo Soares
Referências bibliográficas:
- ALARCÃO, Jorge de (1988) – O Domínio Romano em Portugal – Pub. Europa-América, Mem Martins.
- ALVES, Adalberto (2007) – Portugal e o Islão Iniciático – Ésquilo, Lisboa.
- CATARINO, Helena Maria Gomes (2000) – Topónimos Arrábida e a Serra da Arrábida – Sesimbra Cultural, Ano 1, nº 1, Câmara Municipal de Sesimbra.
- COELHO, António Borges (1972) – Portugal na Espanha Árabe – vol. I, ed. Seara Nova, Lisboa.
- FERNANDES, Isabel Cristina Ferreira (2004) – O Castelo de Palmela do domínio islâmico ao cristão – Ed. Colibri, Câmara Municipal de Palmela.
- RASTEIRO, Joaquim (1897) – Notícias archeologicas da Peninsula da Arrábida – O Arqueólogo Português, vol. III, Lisboa.
- RIBEIRO, Orlando (2004) – A Arrábida. Esboço Geográfico – Fundação Oriente, Câmara Municipal de Sesimbra.
- SILVA, Carlos Manuel Lindo Tavares da; SOARES, Joaquina (1986) – Arqueologia da Arrábida – Parques Naturais. Lisboa: Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza.
Esquemas de Google Earth de Coina-a-Velha criados por António Carvalho (obrigado!)