Castelo de Paderne

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Na margem esquerda da Ribeira de Quarteira, sobre um expressivo meandro da mesma, na cota de 100 m, ergue-se o Castelo de Paderne. Este encontra-se implantado numa colina de calcários do Jurássico Superior, com um declive bem acentuado, de orientação sudoeste-nordeste, constituindo um excelente ponto estratégico bem demarcado na paisagem envolvente, dominando-a efectivamente.

O Castelo de Paderne é um hisn, uma pequena fortificação rural hispano-muçulmana do período almóada (2.ª metade do século XII e primeiras décadas do século XIII), em cujas muralhas foi utilizado um único e já perdido processo construtivo: a taipa militar. O processo consistia em amassaduras de terra local, acrescidas de inertes e estabilizadas com cal aérea (numa percentagem de 12% a 15%), que eram compactadas, entre taipais, por apisoamento. O bloco ou módulo obtido, uma vez exposto a prolongada carbonatação, adquiriu a resistência de pedra com que chegou a nós.

Este castelo é um dos que figuram na Bandeira de Portugal e foi conquistado aos mouros por D. Paio Peres Correia em 1248, sendo definitivamente desactivado em 1858. Em consequência do seu progressivo abandono, a partir do século XVI, manteve a tecnologia construtiva e o desenho arquitectónico de base que lhe deram os seus fundadores almóadas. O mesmo abandono que possibilitou que as intervenções arqueológicas dos últimos anos exumassem estruturas tardomedievais demonstrativas da existência, no interior das muralhas, de um espaço planificado e totalmente urbanizado de raiz, constituído com base em ruas estreitas percorridas por um complexo sistema de drenagens que conduzia as águas residuais para o exterior da muralha. As ruas formavam quarteirões, com uma densidade de ocupação própria de contextos urbanos da época, preenchidos por características habitações almóadas, de pátio central descoberto ao qual acediam todas as salas. Após a conquista cristã, uma nova população, com conceitos distintos do que era o espaço doméstico, procederá à adaptação ou alteração do modelo inicial. No interior, estão ainda identificadas duas cisternas que dão testemunho dos dois principais momentos de ocupação do castelo – o islâmico e o cristão.
O castelo de Paderne é paradigmático da arquitectura militar almóada de taipa em Portugal. Configurou-se, na sua origem, como um pequeno recinto de forma trapezoidal irregular com um escasso hectare, envolto por uma robusta muralha de taipa militar, tendo, a sudeste, um vão de acesso directo à malha ortogonal da alcaria implantada no interior. Aquele único acesso, mantém a norte, localizada sensivelmente a meio do alçado nascente, no exterior da muralha, a cerca de 2,10 m desta, uma torre albarrã (al-barrāniya), que se une à muralha através de um passadiço, com a forma de um quadrilátero, medindo cerca de 2,90 m por 2,80 m, sustentado por um imponente arco. A torre apresenta planta quadrangular, uma altura máxima conservada de cerca de 9,30 metros e, no topo, um piso com uma área de cerca 30 m². A intervenção arqueológica na torre albarrã veio colocar a hipótese de ter existido um “parapeito” com aberturas de frechas ou seteiras. Originalmente, de acordo com fotografia publicada na “Monografia de Paderne” de Ataíde de Oliveira (1910), toda a estrutura (arco e o passadiço) seria em taipa, contudo as obras de conservação da DGEMN (1986) fizeram com que hoje corresponda, na sua metade inferior, a uma alvenaria de pedra.
No espaço interior, junto ao vão de acesso, são visíveis as ruínas de uma ermida que foi de evocação a Nossa Senhora da Assunção e conheceu romarias na data da sua padroeira (15 de Agosto) e, no dia da Anunciação, a 25 de Março. Em 1858 já se encontrava-se em ruína e desactivada do culto porque, nessa ano, com a justificação de que estava abandonada, o Livro de Actas da Junta da Paróquia regista a deliberação de que as telhas e as madeiras se retirariam em benefício da Igreja Matriz e da Ermida de Nossa Senhora Pé da Cruz. Possivelmente a Ermida de Nossa Senhora do Castelo ou de Nossa Senhora da Assunção terá ocupado parte da área do templo que foi a primitiva sede paroquial de Paderne pois, entre meados do século XIII e as primeiras décadas do século XVI, o adro do lado da muralha funcionou como cemitério.
Classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1971, este monumento tem sido objecto de estudo com vista à sua valorização e integração classificada nas áreas envolventes à Ribeira de Quarteira, enquanto Área de Paisagem Protegida. Esta abordagem tem contemplado a identificação de vários núcleos de interesse arqueológico e etnográfico, bem como a caracterização da fauna e flora por ali existentes.


A cerca de 200 m a sudeste do Castelo de Paderne, sobre a ribeira de Quarteira, e a 2.250 m a sul da povoação de Paderne, foi edificada uma ponte de alvenaria, possivelmente romana, com a data de 1771 inscrita no seu parapeito, sobre o arco central, talvez após a sua provável reconstrução por efeitos do terramoto de 1755. Possuí 3 arcos de volta perfeita, defendidos por 2 talha-rios com parapeito.

Azenhas da Ribeira de Quarteira | Paderne

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Em pleno Barrocal Algarvio, numa área de relevos pouco vigorosos, abrem-se as bacias das três linhas de água (Ribeiras de Alte, Sumidouro e Algibre) que convergem, a norte de Paderne, formando a Ribeira de Quarteira – uma bacia hidrográfica de 361 km, com um comprimento de curso de 54 km.

Na margem direita da Ribeira de Quarteira, a 100 m do Castelo de Paderne, localiza-se a chamada “Azenha do Castelo”. Trata-se de um sistema de moagem tradicional que aproveitava a água da ribeira como força motriz. Desconhece-se a data da sua construção, contudo, sabe-se que estes engenhos são anteriores aos moinhos de vento, constituindo um legado da presença árabe. Na Carta de Foral da Vila de Albufeira e seu Termo, concedida por D. Manuel em 1504, já é possível encontrar referências a estes sistemas de moagem, o que permite presumir a sua antiguidade e o importante papel que desempenharam no tradicional fundo tecnológico das comunidades que ali viviam.

Fonte: Nobre, I. (2004) - Património Histórico Monumental. Paderne. Câmara Municipal de Albufeira.


Esta azenha foi recuperada enquanto “museu vivo”, encontrando-se outra a aguardar a mesma atenção, mais a jusante, desta feita na margem esquerda da Ribeira de Quarteira, junto à antiga “ponte do Castelo de Paderne”. Neste último caso, é fácil reparar no pavimento do edifício de moagem por se encontrar completamente revestido por mós exaustas e seus fragmentos; enquanto, no edificado associado, destaca-se um resistente forno de aparelho calcário que, seguramente, ainda hoje poderia cozer pão.


Ribāt da Arrifana | Ponta da Atalaia | Aljezur



Em 2001, Mário e Rosa Varela Gomes, arqueólogos do Instituto de Arqueologia e Paleociências da Universidade Nova de Lisboa, identificaram, na Península hoje denominada por Ponta da Atalaia, na Arrifana de Aljezur, um convento-fortaleza de monges-guerreiros (murābitūn) – o ribāt al-Rihana. Fundado por Ibn Qasī (Abūl – Qāsim Ahmad Ibn al-Husayn Ibn Qasī), a sua existência já era conhecida através de remotas referências bibliográficas, subsequentes ao desaparecimento daquele conhecido teólogo sufi e líder político, em meados do século XII. Cruzando a informação histórica e arqueológica, tudo indica que este estabelecimento islâmico terá sido edificado em cerca de 1130, tendo sido definitivamente abandonado em 1151, com a morte do seu fundador.
Ibn Qasī, natural de Silves e originário de uma antiga e abastada família cristã, foi educado por mestres de Niebla, Sevilha e Silves, após uma juventude irrequieta de boémia e poesia, embora tendo depois desempenhado importantes cargos administrativos em Silves, então florescente capital do Gharb.
O ribāt da Arrifana constitui um raro conjunto de estruturas arqueológicas, até à data único em Portugal, sendo que, em toda a Península Ibérica, apenas se conhece outro exemplar desta natureza – o ribāt de Guardamar, situado no antigo delta do rio Segura (Alicante), na Costa Levantina. Este, embora mais antigo, cerca de um século, apresenta algumas afinidades com o da Ponta da Atalaia, nomeadamente na localização em península, junto ao mar, como na forma e dimensões de algumas das mesquitas identificadas.
Erigido sobre a Ponta da Atalaia, 6 km a poente de Aljezur, integra-se numa paisagem forte e expressiva, caracterizada pelo isolamento e largueza do horizonte atlântico, dominando, também, as vizinhas arribas costeiras e as terras envolventes. O espaço do ribāt encontrava-se simbolicamente hierarquizado através das diferentes estruturas do complexo edificado.
Os trabalhos arqueológicos, desenvolvidos desde 2001/2002, têm permitido identificar uma sucessão de mesquitas com mihrabs (nichos em forma de abside que indicam a direcção de Meca – qibla) e respectivos minaretes (torres de onde os fiéis eram chamados às orações, pelo menos cinco vezes ao dia), assim como um conjunto de dependências anexas, destinadas tanto aos monges como aos peregrinos. O espólio exumado não é abundante, quando comparado com arqueossítios islâmicos contemporâneos da região. Destacam-se as cerâmicas (de mesa, cozinha e armazenamento), embora também se tenham exumado artefactos metálicos (canudo-amuleto, dois rolos de chumbo, pendente, ferro de lança, etc.) e uma pequena conta de faiança.
O ribāt da Arrifana encontra-se presentemente em processo de classificação pelo IGESPAR, I.P.
Por fim, de referir as curiosidades de o topónimo “Atalaia” remeter para ocupações islâmicas, tendo amiúde sobrevivido até aos nossos dias em vários locais e em expressões como “estar de atalaia” (al-talai’â); enquanto o termo “ribāt” ainda ecoa na língua portuguesa em expressões como “tocar a rebate” – os piedosos muçulmanos tinham uma obrigação de “ribat” ou alerta.



ribāt da Arrifana, em Aljezur, foi classificado como Monumento Nacional (Dec. nº 25/2013), sendo o primeiro daquele concelho com tal categoria e um dos poucos que fazem parte do legado islâmico do actual território nacional.


Fontes:
  • Associação de Defesa do Património Histórico e Arqueológico de Aljezur - link
  • O Ribat da Arrifana (Aljezur, Algarve) - Resultados da campanha de escavações arqueológicas de 2002 (Rosa Varela Gomes e Mário Varela Gomes) - link