Cozedura cerâmica em fogueira - "soenga"


Trata-se do mais antigo e simples sistema de cozedura de cerâmica, certamente utilizado durante os períodos pré-históricos. A cozedura de cerâmicas depende de três variáveis independentes – tempo, temperatura e atmosfera – detectáveis, nomeadamente, na cor e dureza das pastas após a cozedura (escala de Mohs).
O solo deve ser previamente preparado com uma ligeira depressão ("soenga"), ou simplesmente aplanado e circunscrito com um anel de terra. São então queimadas madeiras de modo a produzir um braseiro que irá retirar a humidade da terra e das peças a cozer, dispostas criteriosamente com a boca para baixo. O calor produzido pelas brasas atinge uma temperatura acima dos 100º C, o que permite uma secagem completa da argila, evitando prováveis roturas produzidas pelo vapor de água remanescente nos poros.

Após esta etapa preparatória, as peças são totalmente cobertas por material combustível seco: carvão, palha, caruma de pinheiro, ramos, gravetos, "bosta de vaca" e lenha. A fogueira é então acesa, sendo regularmente alimentada evitando brechas que permitam vislumbrar as peças. Na fase final da cozedura torna-se necessário queimar madeira de alto poder calórico, proporcionando um significativo aumento da temperatura.

A duração deste método de cozedura é relativamente curta, em comparação com a cozedura em fornos, o que pode provocar fracturas nas peças. Tal pode ser contrariado com a adição de materiais desengordurantes - chamota (cerâmica cozida triturada), elementos minerais ou fibras vegetais - permitindo suportar o choque térmico da cozedura rápida.


No que se refere à variável da temperatura, esta depende de dois factores: do tipo de estrutura de combustão e da própria qualidade das argilas (maior ou menor refractibilidade, dependendo da quantidade de óxidos de ferro e de materiais orgânicos). A temperatura da cozedura em soenga é pouco homogénea, com oscilações não controladas variando entre os 600 e os 850º C. Este método de cozedura é eficiente mas tem algumas desvantagens: as cerâmicas podem fractuar facilmente durante a cozedura; pouca homogeneidade das cores finais dos recipientes, devido à distribuição desigual do calor - só alguns recipientes (ou partes destes) ficam em contacto directo com o combustível, isto provoca uma coloração desigual, com áreas de castanho mais escuro, outras quase negras e outras, ainda, apresentando castanhos claros ou tons avermelhados. As cerâmicas empilhadas, além de contactarem o combustível, cozem em ambiente redutor e oxidante, conforme a fase da cozedura. Até ao pico da temperatura, com a queima do combustível, o ambiente é tendencialmente redutor, dando-se a libertação do monóxido de carbono que impede a oxidação das argilas; já na fase de arrefecimento, a atmosfera torna-se oxidante. Uma forma de obter uma coloração mais uniforme nos recipientes cozidos em fogueira consiste em cobrir a fogueira com terra, este processo corta o fornecimento de oxigénio resultando em paredes negras devido à deposição de carbono.






Acção realizada nos dias 3 e 4 de Junho de 2011, no Telheiro da Encosta do Castelo - Oficinas do Convento, em Montemor-o-Novo,
sob a coordenação de Virgínia Fróis e Sara Navarro
(Faculdade de Belas Artes - Lisboa)

Cozedura cerâmica em cova



Trata-se de uma variante mais complexa da cozedura em fogueira, mais eficaz uma vez que as paredes da cova conservam melhor a temperatura, atingindo assim valores térmicos mais elevados e estáveis. O fogo controlado e o arrefecimento mais lento reduzem, substancialmente, os riscos de fractura das peças.


Começa-se por escavar uma pequena cova na terra, com uma profundidade igual ao diâmetro, de preferência numa encosta, por ser mais fácil e por ser mais abrigada do vento quando o local é escolhido com essa atenção. Seguidamente queima-se algumas ramagens secas no interior da cova, no sentido de retirar o máximo de humidade das paredes e fundo de terra. O fundo e paredes podem ser revestidos com tijolo burro ou refractário. As primeiras peças são então cuidadosamente depositadas sobre as brasas, sendo os espaços preenchidos por material combustível leve (serradura, carvão ou palha). Quando as peças são pequenas, esta operação pode ser repetida por camadas.
Este sistema de cozedura pode ser optimizado introduzindo no interior da cova um sistema de ventilação, um tubo central, ou dois laterais, que são retirados após o preenchimento da câmara de combustão. Esta operação permite uma melhor queima do combustível do fundo, atingindo-se temperaturas mais elevadas.
Após completa a tarefa de enchimento da cova (peças e combustível), a boca é "coroada" com uma grelha de ferro onde será ateada uma fogueira, alimentada com ramos e troncos de alto poder calórico. Esta grelha irá permitir a passagem de brasas, impedindo a queda de troncos maiores que certamente quebrariam as peças. As brasas que vão caindo juntam-se ao material combustível previamente adicionado junto das peças, cobrindo-as totalmente até ser atinginda a temperatura máxima. Após terminada a cozedura, há que aguardar pelo arrefecimento das peças antes da sua extracção.
Este método de cozedura permite um controlo da atmosfera: se se pretender uma atmosfera oxidante, deixa-se o fogo extinguir de forma natural; caso se pretenda obter peças negras, a atmosfera terá que ser reduzida, cobrindo-se a fogueira com terra, de forma a impedir a entrada de ar na combustão. Desta forma a temperatura irá permanece elevada e o fogo carbonizará a argila, impedindo a oxidação dos óxidos de ferro existentes na composição das pastas.
Tal como na fogueira/soenga, este tipo de cozedura manifesta rápidas oscilações de temperatura, pelo que o tipo de argila e os elementos desengordurantes escolhidos tornam-se importantes para o sucesso da cozedura.


Acção realizada nos dias 3 e 4 de Junho de 2011, no Telheiro da Encosta do Castelo - Oficinas do Convento, em Montemor-o-Novo,
sob a coordenação de Rosana Bortolin
(Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina - Brasil)

Cozedura cerâmica em forno de tijolo


A sua construção é bastante fácil, recorrendo-se a tijolos sobrepostos verticalmente (tijolo burro, perfurado ou refractário), toscamente "cimentados" com barro de modo a conferir estabilidade estrutural e alguma circulação de ar. Na base reserva-se uma pequena entrada (o espaço de um tijolo) onde será ateado o fogo, servindo, também, para controlar a circulação do ar.

A capacidade do forno depende da quantidade/volume das peças a cozer. Podem ser organizados andares de grelhas metálicas, permitindo uma distribuição mais equilibrada e sem contactos entre as peças, evitando a sua queda e quebra após a queima do combustível.

Ao longo da construção das paredes do forno vão sendo acomodadas as peças e o combustível, preenchendo toda a câmara de combustão. O combustível adequado para este tipo de forno é a serradura - "forno de tijolo ou de serradura" - podendo ser adicionado carvão. A serradura ideal é a obtida a partir de madeiras duras (carvalho, nogueira ou castanheiro), porque possui maior energia calorífera e arde mais lentamente. Caso se utilize serradura mais branda (de pinheiro, abeto, olmo ou choupo), a combustão deverá ser controlada, arriscando-se uma queimada demasiadamente rápida e fatal para algumas peças. As peças devem estar totalmente secas, dispostas a cerca de 10 cm das paredes do forno e distando entre si cerca de 5 cm.

Após "recheado", sendo a última camada de combustível, o forno deverá ser coberto com uma placa de material refractário ou metálico, ficando um mínimo espaço para a circulação de ar e para que o fogo abafado não se extinga.

A duração da cozedura depende da dimensão do forno, variando entre algumas horas até um ou dois dias. A redução do escape do fumo será o indício do fim da combustão. Quando o forno terminar de fumar, é necessário deixa-lo arrefecer antes de se retirar as peças, que tendem a apresentar cores claras em resultado de uma cozedura lenta em ambiente oxidante.

Neste tipo de estrutura de combustão a temperatura pode atingir cerca de 700º C.




Acção realizada nos dias 3 e 4 de Junho de 2011, no Telheiro da Encosta do Castelo - Oficinas do Convento, em Montemor-o-Novo,
sob a coordenação de Rosana Bortolin
(Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina - Brasil)